Astronomia Cultural

“ASTRONOMIA CULTURAL” EM LIVROS DIDÁTICOS DE FÍSICA APROVADOS NO PNLEM 2012

 Autoras:

Marta de Souza Rodrigues (Mestranda da Universidade de São Paulo/Instituto de Física) e Cristina Leite (Universidade de São Paulo/Instituto de Física)

Trechos do Artigo:

[…] O intuito, por fim, é compreender de que forma e com qual frequência a astronomia cultural tem sido tratada por estes materiais. […] Desta forma, usando como referência os livros de física aprovados no último PNLEM, que estão sendo distribuídos nacionalmente em 2012, estes foram tomados como base para compor a amostra analisada, presente no quadro 1.

Quadro 1: Catálogo de livros – PNLEM 2012

Título da Obra

Autor

Editora

(…)

Física em Contextos

PIETROCOLA et al.

FTD

(…)

As obras consideradas, em todos os casos, consistem em coleções compostas por três volumes e todos estes foram tomados para a identificação, num primeiro momento, da presença dos conteúdos de astronomia. Para tanto, recorreu-se ao sumário dos materiais. Todas as coleções possuem pelo menos um capítulo no qual são tratados assuntos relacionados à astronomia. Os mais recorrentes foram: Gravitação Universal e Leis de Kepler. Alguns materiais (Pietrocola et al., 2010 e Menezes et al., 2010), todavia destinaram uma unidade inteira exclusivamente à astronomia, sendo trabalhado um conjunto maior de tópicos nestes casos.[…]

Após o contato com todas as coleções e identificados os trechos, recortes de interesse para a análise junto ao tema da astronomia cultural, foram propostas três grandes categorias para comportar a variedade de abordagens encontrada. São estas: “Diversidade Cultural”, “Cultura na Astronomia” e “Outros”. […] Em se tratando de “Cultura na Astronomia”, a principal preocupação deste agrupamento é mostrar as influências culturais particulares junto a temas da astronomia. […] A categoria “Diversidade Cultural” procura agrupar aspectos que se referem à existência de formas diversas de organização e produção cultural, em um movimento que busca mostrar além dos feitos e considerações relativas ao mundo ocidental. […] No caso da categoria “Outros”, estão agrupados justamente os materiais que pouco apresentaram contribuições para o debate envolvendo a astronomia cultural […]

Três obras […] trouxeram aspectos contemplados tanto em “Diversidade Cultural” quanto em “Cultura na Astronomia”. […] “Física em Contextos” (e outra) […], por destinarem atenção maior à astronomia, consequentemente, foram os materiais mais significativos dentro do tema da análise proposta. A começar pelo primeiro, os aspectos que o aproximam da categoria “Cultura na Astronomia” tratam da elucidação acerca do conhecimento egípcio do céu e sua relação direta na agricultura e da questão estética grega envolvendo os círculos, de forma associada à ideia de órbitas circulares para os planetas. Os pontos que contemplam a categoria “Diversidade Cultural” estão relacionados à citação da construção de calendários por diversos povos, além da referência (implícita) a uma interpretação para a cultura, com viés universalista por estabelecer uma ordem de evolução desta quando se faz menção ao “homem primitivo”. […]

Quadro 2: Categorização dos materiais.

Obras

Categorias
Diversidade Cultural Cultura na Astronomia

Outros

(…)

Física em Contextos

X

X

 
(…)

Considerando apenas as categorias “Diversidade Cultural” e “Cultura na Astronomia”, é possível ainda que subcategorias sejam criadas, com o intuito de pormenorizar a análise para evidenciar uma compreensão mais apurada (porém enxuta) dos materiais (quadros 3 e 4). O critério neste caso está relacionado com a identificação de temáticas mais gerais que são recorrentes dentro de uma mesma forma de abordagem.

Quadro 3: Subcategorias para “Cultura na Astronomia”

Obras

Categorias

Estética e Manifestações Artísticas Catolicismo

Astronomia e Cotidiano

(…)

Física em Contextos

X X

X

(…)

No que diz respeito às subcategorias de “Cultura na Astronomia”, o agrupamento “Estética e manifestações artísticas” está relacionado, de alguma forma, a uma noção de cultura, pois nele se encontram os materiais que fizeram referência tanto a questão da perfeição atribuída aos círculos e esferas pela cultura grega, quanto à aproximação da ciência ao contexto das obras de arte. Já em “Catolicismo”, estão coleções que, principalmente no debate durante os séculos XV e XVI envolvendo a ascensão do heliocentrismo, apontaram o poder da igreja católica e seus dogmas em afirmar a teoria geocêntrica. “Astronomia e cotidiano” representa a associação entre elementos celeste e o cotidiano de forma ampla (indo desde práticas como a agricultura à crença em divindades).

Quadro 4: Subcategorias para “Diversidade Cultural”.

Obras

Categorias

Calendários Cosmologias Universalismo Cultural

Relativismo Cultural

(…)

Física em Contextos

X X X

 

(…)

Portanto, a citação acerca da construção de calendários, assim como as ideias sobre a origem do universo, planeta e vida por parte de diversos povos foram temas recorrentes nos materiais da categoria “Diversidade Cultural”, que surgem nas respectivas subcategorias: “Calendários” e “Cosmologias”. Foram percebidas ainda duas interpretações acerca da cultura, correspondendo às subcategorias que se referem ao universalismo e relativismo cultural. No que diz respeito ao “Universalismo Cultural”, a ideia implícita está relacionada à noção de evolução da cultura com um sentido linear de progresso, caminhando de organizações ditas primitivas às julgadas mais desenvolvidas. Já em “Relativismo Cultural”, é predominante a concepção multilinear para a cultura, que também se aproxima à legitimação, reconhecimento de diferentes formas de organização cultural, de acordo com sua função e coerência interna. […]

Ainda assim, a existência de dois materiais na análise com tratamento mais extenso e sólido sobre o tema, como ocorre em […] Pietrocola et al. (2010), precisa ser ressaltada, ainda mais considerando a forma diversificada que cada grupo de autores abordou a astronomia cultural. […] A abordagem cultural pode fomentar nos estudantes uma postura reflexiva diante dos caminhos que o conhecimento científico possui junto a um determinado contexto e forma de organização cultural, além de incentivar uma postura de entendimento, compreensão, respeito em relação às diferenças e convivência com o que é plural.

Conheça o Artigo Completo no link:  http://snea2012.vitis.uspnet.usp.br/sites/default/files/SNEA2012_TCO17.pdf

 

Vídeo: Entre sons e sensações

Este vídeo é dedicado a conversar com os professores de Física sobre as atividades do Volume 2 da coleção, que exploram as relações entre física e música. Algumas personalidade que contribuíram para as primeiras sistematizações de princípios gerais da música como arte e como ciência são apresentadas e estudadas na atividade histórica tema da conversa deste vídeo. Esperamos que gostem do vídeo e que seja motivador e traga novas ideias para o desenvolvimento da atividade!

Vídeo: As Revoluções das Esferas Celestes

O vídeo de hoje trata da atividade histórica que propõem a análise de partes do livro de Nicolau Copérnico sobre “As Revoluções das Esferas Celestes”.
Pensadores da Antiguidade Clássica, como o grego Aristarco de Samos, já especulavam um sistema de mundo com o Sol no centro, mas foi somente no Renascimento que o modelo heliocêntrico foi tratado com base em cálculos matemáticos das posições dos astros e diagramas elaborados sobre o movimento celeste.

A base desta atividade é o prefácio do livro de Copérnico, que foi escrito pelo teólogo luterano Andreas Osiander, amigo de Copérnico e que se empenhou na publicação da obra.
Por se tratar de um texto muito antigo, os alunos podem sentir dificuldades com a linguagem utilizada. Por isso, sugerimos iniciar a atividade na sala de aula, fazendo leitura compartilhada com a classe e discutindo coletivamente. Essa discussão será importante para nortear as respostas das questões que podem ser feitas como atividade extraclasse.
O primeiro ponto de destaque é o fato do novo sistema de mundo, proposto por Copérnico, ser tratado apenas como hipótese tanto no título quanto ao longo do texto.
Na época da publicação, contradizer o universo geocêntrico era considerado heresia, pois retirar a Terra do centro do universo, também significava tirar o homem do centro e a razão de ser da criação do mundo. Assim, Osiander usou o termo hipótese com intuito de diluir o impacto que a obra provocaria naquele momento.
Outro aspecto que merece interpretação junto aos alunos são os trechos em que se trata dos sábios que ficariam indignados com a mudança das disciplinas liberais há muito bem estabelecidas. Nesse momento do texto, Osiander está se referindo aos intelectuais e religiosos que defendem e difundem as teorias aristotélicas e a tradição geocêntrica, vigentes desde a antiguidade clássica.
Contudo, mesmo contradizendo as crenças científicas e religiosas vigentes, Osiander ressalta que as revoluções de Copérnico não merecem reprovação. Esse é o terceiro ponto a ser discutido, pois segundo ele o é papel do astrônomo usar os dados obtidos, a partir de criteriosas observações e não apenas por divagações e raciocínio, para elaborar o melhor modelo que permita investigar e compreender com a maior precisão possível os movimentos do céu. Além disso, pode-se notar que Osiander não coloca o heliocentrismo como a verdadeira representação do universo, mas apenas como o modelo mais adequado e coerente para as observações celestes. Talvez esse seja mais um artifício na tentativa de amenizar o choque que a obra causaria no momento da publicação.
Também será interessante discutir quais são os absurdos e inconsistências que essas disciplinas há muito bem estabelecidas apresentam, como por exemplo, as observações reais do planeta Vênus em contraposição ao que seria esperado no sistema aristotélico-ptolomaico.
No sistema geocêntrico o planeta Vênus, durante o movimento em seu epiciclo, ora está mais próximo a Terra, ora está mais distante, assim caso está teoria estivesse correta deveríamos observar mudanças no tamanho do planeta, o que não acontece.
Para finalizar é importante ressaltar que apesar do sistema de mundo copernicano responder a algumas indagações, não foi capaz de apresentar todas as explicações.

(i) Ainda permaneceu a esfera das estrelas fixas,

(ii) os planetas não estavam soltos no espaço, mas presos em esferas cristalinas que os sustentavam e os carregavam juntos em seu movimento,

(iii) não soube justificar a razão pela qual somente a Lua orbitava nosso planeta,

(iv) nem a causa da queda dos graves e o motivo dos corpos terrestres acompanharem o movimento da Terra em seu giro pelo espaço.

Essas questões necessitaram de mais algumas centenas de anos e o desenvolvimento do conhecimento científico e dos instrumentos de observação celeste para serem respondidas.
Professor, desejamos que esta atividade favoreça o entendimento da trajetória histórica em direção a obtenção de uma explicação adequada para o movimento dos corpos celestes!

Vídeo: Foi Assim… Investigue com o Pesquisador

Vídeo de apresentação da seção Foi Assim… Investigue com o Pesquisador.

Comumente a formação científica escolar está pautada apenas nos produtos do conhecimento, o que acaba contribuindo para a visão de uma Ciência estática, na qual conceitos e leis são tidos como descobertas realizadas por mentes geniais num “passe de mágica”. Deixar de abordar os enganos cometidos, as controvérsias entre idéias e a influência do contexto sócio-econômico, significa suprimir o dinamismo envolvido na evolução e aprimoramento/aperfeiçoamento do fazer científico.
A inserção de uma perspectiva histórica no ensino de Ciências ajuda na compreensão dos conteúdos pelos alunos, na medida em que traz a origem dos conceitos, contextualiza o conhecimento e apóia a interdisciplinaridade. A História favorece a concepção da Ciência como um empreendimento humano na busca por respostas a questões do mundo natural e da realidade do seu tempo, e que, por isso, deve ser considerada como parte integrante da nossa cultura.
Acreditamos também que a História da Ciência não deve ser vista como conteúdo extracurricular. Assim optamos por utilizar a abordagem histórica como uma estratégia didática que permeia toda a coleção, através da linha do tempo, do texto da maioria dos capítulos, de questões para discussões individuais ou coletivas, dos boxes com a biografia de cientistas e das atividades históricas.
Nessas atividades, os alunos são convidados a ler, interpretar e discutir trechos de textos originais de importantes cientistas da História da Física, ou seja, pesquisadores do passado.
O contato com esses fragmentos de textos históricos permitirá aos alunos terem contato com a linguagem e as analogias de outras épocas, compreenderem as dificuldades envolvidas no tratamento de alguns princípios físicos quando a matematização dos conceitos ainda não tinha sido formulada, perceberem a origem e o desenvolvimento de algumas idéias e os debates entre cientistas contemporâneos, o que contribuirá para uma visão critica ao evitar crenças distorcidas sobre o fazer científico.